El Niño deve elevar temperatura global acima de 1,5°C pela 1ª vez; veja efeitos em SC

Um relatório divulgado pela OMM (Organização Mundial de Meteorologia) na semana passada gerou mais um alerta sobre a possibilidade de níveis recordes de temperaturas globais nos próximos cinco anos. O efeito seria sentido em diversas regiões do planeta com ondas intensas de calor, alimentadas por gases de efeito estufa e o evento natural do El Niño.

Para compreender melhor como um fenômeno desta magnitude poderia afetar a vida no planeta Terra e em Santa Catarina, o ND+ conversou com a professora e pesquisadora sobre clima do Departamento de Oceanografia da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), Regina Rodrigues.

Todos os modelos climáticos apontam para um El Niño forte no final de 2023

Pesquisadora da UFSC esclarece dúvidas sobre os impactos do fenômeno El Niño no aquecimento do planeta – Foto: Pexels/Reprodução/ND

De acordo com a pesquisadora, existem duas evidências que são usadas para prever o El Niño: as observações oceanográficas no Pacífico Tropical e previsões de modelos climáticos.

A professora explica que “existem mais de 70 boias meteoceanográficas distribuídas no Pacífico Tropical para monitorar esse fenômeno. E essas boias já mostram o aquecimento do Pacífico Tropical, principalmente em subsuperfície”, afirma.

“Provavelmente vão aflorar até a superfície no final do ano. A outra evidência é que todos os modelos estão prevendo um El Niño forte para o final do ano”, complementa.

Efeitos do El Niño em escala global e áreas mais suscetíveis

De acordo com Rodrigues, como a atmosfera é muito sensível às mudanças na temperatura das águas dos oceanos tropicais e o Pacífico Tropical é muito extenso, esse aquecimento das águas do Pacífico altera a circulação atmosférica em várias regiões do mundo, principalmente na América do Sul e, portanto, no Brasil.

“Além disso, essa elevação da temperatura da superfície do Pacífico Tropical acaba levando a um aumento da temperatura global da Terra. E acredita-se que com o estabelecimento deste El Niño no final do ano, a temperatura global da Terra subirá mais de 1,5°C pela primeira vez na sua história recente”.

A pesquisadora lembra que o Acordo de Paris, firmado em 2015, foi estabelecido para que não passássemos desse valor que é considerado o limite seguro.

“Acima disso, os cientistas preveem que o clima ficará muito instável com muitos extremos e perigoso para nossa sobrevivência. É verdade que isso provavelmente será temporário. Mas será a primeira vez que tocaremos nesse limite”, diz a especialista.

Possíveis impactos climáticos em Santa Catarina

Independente de o El Niño fazer ou não a temperatura global passar de 1,5°C acima da média, um El Niño forte como se está prevendo para este ano pode causar muita chuva no Sul do Brasil e secas no Norte e Nordeste.

“Por exemplo, as enchentes de 1983 no Vale do Itajaí Açu foram causadas pelo El Niño daquele ano. Em termos de temperatura, a tendência é ficar mais quente no Sudeste e Centro-Oeste, podendo pegar parte de Santa Catarina”, afirma Rodrigues.

“É bom lembrar que cada evento de El Niño é diferente do outro e os impactos também variam. Às vezes chove mais no Rio Grande do Sul e às vezes em Santa Catarina”, explica.

Outro ponto importante é que talvez esse aumento na temperatura global cause uma incidência maior de outros extremos, como ventos fortes, tempestades e ciclones. Mas como será a primeira vez, não se sabe ao certo o que esperar neste ano.

Medidas de adaptação recomendadas

Para a pesquisadora, a agricultura sem dúvida é a atividade econômica mais afetada, além do turismo. A infraestrutura nas cidades pode ficar comprometida e os setores públicos e privados têm que fazer um acompanhamento constante das previsões climáticas para agir.

“Por exemplo, preparar a Defesa Civil para possíveis enchentes, deslizamentos de terra nas áreas vulneráveis, etc. O aumento da temperatura pode causar uma incidência maior de doenças transmitidas por mosquitos, como dengue e febre amarela, que já estão ocorrendo agora”.

Ao ser perguntada sobre como se preparar para os efeitos do fenômeno, a professora explica que devemos seguir as decisões da Defesa Civil caso seja necessário evacuar lugares com perigo de deslizamento e alagamento, ou da Vigilância Sanitária em relação à saúde.

“Porém, não adianta pensar nisso só agora na eminência do evento. Medidas têm que ser tomadas a longo prazo para aumentar a resiliência da sociedade. Por exemplo, não deixar construir em áreas muito íngremes ou próximas a rios e praias, proteger os mananciais, mata ciliar e manguezais”.

Por fim, a pesquisadora acrescenta ainda que, depois de deixar esses ambientes naturais de proteção serem destruídos e colocar moradias, fica difícil a população mitigar os efeitos das mudanças climáticas.

“Santa Catarina precisa ter metas de redução de emissão dos gases do efeito estufa também, ou seja, políticas públicas que façam com que a sociedade catarinense seja mais resiliente”.

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