‘Masculinidade tóxica’: antropóloga explica aumento de 9,6% da violência doméstica em SC

Os casos de violência doméstica em Santa Catarina aumentaram 9,6% nos primeiros meses deste ano, segundo dados da Polícia Civil. Apesar de existir um aumento de notificações devido a medidas do governo federal, a antropóloga da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), Carmen Rial, aponta um aumento da violência como um todo.

Violência doméstica aumenta quase 10% em Santa Catarina nos primeiros meses deste ano – Foto: Carlos Jr/ND

“Esse aumento vem crescendo há bastante tempo, porque se criou uma ideia de masculinidade tóxica, que se expressa através da violência: contra as mulheres, nas escolas, contra pessoas que têm uma opinião diferente desses homens”, explica a antropóloga.

Além disso, Carmen avalia que o incentivo à “política armamentista, de uma política que dividia o gênero de uma forma essencialista, onde os homens precisavam mostrar-se homens, expressando ações que os distinguissem de uma feminilidade, de uma fragilidade, traz consequências”.

De 1º de janeiro até 11 de abril de 2023, foram registrados 19.668 casos de violência em Santa Catarina, contra 17.940 durante o mesmo período do ano passado.

Um episódio recente de violência que chamou atenção no país foi do surfista, natural do Espírito Santo, João Paulo Azevedo, que agrediu em alto mar a surfista norte-americana Sarah Taylor, em Bali, na Indonésia. Ele foi filmado desferindo socos na mulher.

JP Azevedo já agrediu a ex-namorada Carolina Braga, de 41 anos, moradora de Garopaba, na Grande Florianópolis. Ela afirmou que eles namoraram entre 2018 e 2019, e que o relacionamento acabou depois de ser agredida por ele.

Ainda segundo a catarainense, ela foi hospitalizada com traumatismo craniano e depois se isolou por quase três meses em uma pousada no Rio de Janeiro, até que as marcas físicas desaparecessem.

Atualmente, são 32 Dpcamis (Delegacias de Proteção à Criança, ao Adolescente, à Mulher e ao Idoso) em Santa Catarina, o que representa 10% das delegacias catarinenses.

Segundo a coordenadora, a delegada Patricia Maria Zimmermann D’Avila, para as Dpcamis funcionarem 24 horas, o que determina uma determinação federal, deve-se aumentar o efetivo da Polícia Civil.

“Não há como, com o atual efetivo, descuidarmos das investigações, da instrução do inquérito policial e abrirmos as delegacias 24 horas por dia. O enfretamento à violência doméstica e familiar passa tanto pelo boletim de ocorrenica como por uma investigação de qualidade”, detalha a delegada.

Neste momento, apenas a delegacia virtual e a Sala Lilás, espaço destinado ao acolhimento e atendimento especializado para vítimas de violência, estão abertas por 24 horas.

“Sentimento de impunidade”

Assim como no caso da surfista norte-americana, cuja violência foi filmada e divulgada na internet, cada vez mais casos de agressões contra mulher em locais públicos têm sido registrados.

Carmen Rial avalia que é uma série de fatores que “incentivam” esses homens a não se sentirem incomodados com uma possível filmagem, como a sensação de que não haverá penalidades.

“Um sentimento de impunidade que foi criado por essa ideologista armamentista. Quem vai para cadeia são jovens, negros e pobres. ‘Eu, branco, de camadas médias e altas, não vou para cadeia de jeito nenhum’. Essa é uma ideia que tem respaldo se a gente olhar as estatísticas de quem está na cadeia no Brasil hoje, além da maneira como a polícia reage em termos de raça no nossos país”, explica Rial.

O fato de aumentarem os registros decorre também de a sociedade estar hipervigilante. “Para o bem e para o mal, tem muitas câmeras nas ruas. Claro que a gente tem uma crítica a uma sociedade de vigilância, mas tem esse outro lado mais positivo, que é uma certa proteção contra a violencia”, comenta.

Assim, as câmeras de estabelecimentos que servem para impedir roubos e depredações também resultam na proteção de pessoas. “Há também as gravações feitas por particulares, que serve como arma de defesa para que fiquem registrados esses delitos.”

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