Mães à distância em SC: um amor sem limites que supera a ausência

“A gente cria o filho para o mundo”. Esse ditado popular é reproduzido com frequência pelas mães e na fala até parece tarefa fácil, mas quando chega a hora se torna um processo doloroso para muitas.

A saída dos filhos de casa, às vezes – até de maneira repentina, pode dar lugar a uma série de preocupações e um vazio que antes era ocupado por uma infinidade de cuidados.

Síndrome do Ninho Vazio tem sintomas de depressão e acomete diversas mães – Foto: Montagem ND

Essa ausência já foi inspiração para músicas, como o clássico do sertanejo “No Dia Em Que Eu Saí de Casa”, e tema central de obras que fizeram sucesso no Brasil, como a trilogia “Minha Mãe É Uma Peça”.

No terceiro filme, o assunto ganhou força e foi abordado como a síndrome do ninho vazio. Dona Hermínia, interpretada por Paulo Gustavo (in memorian), depara-se com a solidão e uma rotina entediante longe dos filhos.

Dona Hermínia, o personagem mais famoso do ator Paulo Gustavo – Foto: Victor Pollack/Rede Globo/Divulgação

Na vida real, há tantas Donas Hermínias, cada uma com a sua história, seus medos e seu modo de ser mãe. Uma delas é a comerciante Nara Augustinho dos Santos, que deu à luz Naiara, de 34 anos, e Natália, de 27.

Ela lida com a ausência da filha mais velha há quase 15 anos. A primogênita se mudou para a Itália assim que completou a maioridade. A caçula também seguiu os mesmos passos e há dois meses deixou a casa da mãe, em Criciúma, para viver em Florianópolis.

“Um primo da Naiara morava fora, e sempre convidava ela para ir. Ao invés de ganhar a carteira de motorista, ela pediu para gente pagar uma passagem. Já a Natália se mudou depois de receber uma oportunidade de trabalho ”, conta Nara.

Quando a saudade aperta, a mãe relembra das filhas com carinho. “Sempre lembro de quando elas estavam em casa, quando eu fazia a comida que elas gostavam, quando íamos passear”.

Além disso, Nara armazena recordações da época em que as filhas ainda eram crianças. “Da Naiara, eu guardo as agendas da escola dela, e tem até um biquíni de quando ela tinha uns 3 ou 4 aninhos. Com a Natália, geralmente eu olho as fotos, mas também tenho alguns brinquedos antigos”.

Mãe guarda agendas antigas de Naiara e Natália – Foto: Luana Miguel/ND

Pandemia adiou encontros

Os reencontros da família, que geralmente aconteciam uma vez por ano, foram sendo adiados devido à pandemia. “Antes, a Naiara vinha para o Brasil todos os anos”, explica Nara.

Após quase dois anos sem ver a primogênita, a mãe decidiu viajar, em 2022, para o continente Europeu. “Como ela não conseguiu vir, nós decidimos ir para lá em agosto do ano passado. E a Natália vem todo o mês”, ressalta.

Da esquerda para a direita: Natália, Nara e Naiara – Foto: Arquivo Pessoal/Nara Augustinho Dos Santos

Sonho de ser avó

Um dos maiores sonhos de Nara sempre foi ser avó. Durante cinco anos, Naiara tentou engravidar, e a surpresa aconteceu há quase seis anos. Com pai italiano e mãe brasileira, o pequeno Leonardo já veio ao Brasil duas vezes.

“Eu sou muito apegada às crianças. Tenho uma sobrinha, e trato ela como se fosse minha neta, e conviver com as crianças ameniza a saudade. Às vezes, eu falo com o Leo, ele me chama de nona, diz que me ama, e assim eu vou indo”, relembra Nara, com lágrimas nos olhos.

Para a avó, o segredo para lidar com a saudade é a fé. “Deus me dá força, é pela fé que eu enfrento. Mas é muito ruim ter as minhas filhas longes, são as preocupações de mãe”.

Lidar com o crescimento dos filhos pode ser muito doloroso – Foto: Luana Miguel/ND

“Aperto no peito”, mãe carrega colar para recordar bons momentos com a filha

A catarinense Patrícia Domingos Guizzo também é mãe de duas garotas, Isabel e Bárbara. Uma ainda é bebê, tem apenas 4 meses e mora na Itália com ela. Já a primogênita Isabel, de 16 anos, está a milhares de quilômetros de distância, em Içara, no Sul catarinense, onde vive com os avós paternos.

Longe de uma das filhas, a rotina de Patrícia se torna por vezes angustiante e carregada de saudade e preocupação. “Ela sempre foi minha grande companheira. Sinto um medo descomunal pela violência que assombra nosso país, de não estar por perto para protegê-la de qualquer situação. Parece pensamento de mãe superprotetora, mas é apenas aquele sentimento que muitas têm de querer abrir uma asa gigante para proteger o filho”, comenta.

Para tentar amenizar esses sentimentos, a mamãe carrega no peito um objeto que representa o amor entre elas. “Ela me deu uma correntinha com dois corações que simboliza eu e ela. Sempre ando com ele, é como se fosse meu amuleto”, conta Patrícia.

Patrícia e sua filha mais velha, Isabel – Foto: Arquivo Pessoal/Patrícia Domingos Guizzo

Constantemente, ela também recorre a videochamadas para conter a saudade. “Mas é muito diferente não estar presente, abraçar, beijar, sentir seu cheiro, porque filho terá sempre o cheirinho de filho. É difícil não correr lágrimas lembrando disso, acredito que todas as mães que têm filhos longe sentem esse aperto no peito”, diz.

De malas para Itália

Patrícia mora há cinco anos na Itália. Ela se mudou para o país com o marido em busca de mais oportunidades e segurança. Desde então, a filha adolescente vive com os avós paternos por quem tem um carinho enorme, segundo a mãe.

“Amam incondicionalmente. Confio muito neles, porque sempre estiveram ao nosso lado, sei que com eles, ela está bem cuidada, mas mesmo assim o amor de mãe fica gritando dentro do peito, e pedindo a Deus que a cuide e seja meus olhos que não posso estar neste momento por perto”, afirma Patrícia.

Reencontro

A família pretende se reencontrar em breve. “Já temos uma data para estar no nosso querido país. Geralmente, as visitas acontecem uma ou duas vezes por ano. Este ano, ela esteve aqui com os avós me auxiliando a cuidar da agora caçulinha. Sempre foi meu braço direito em todos os aspectos”, conta a mãe.

Patrícia e Isabel – Foto: Patrícia Domingos Guizzo

Síndrome do Ninho Vazio

É comum muitas mães se sentirem angustiadas quando os filhos começam a completar a maioridade, casar, fazer intercâmbio ou até mesmo ir morar sozinho. Algumas delas desenvolvem até a síndrome do ninho vazio.

De acordo com a psicóloga Ana Cláudia Benincá, a síndrome é mais frequente do que se imagina. “O paciente vem, geralmente, com a queixa que está com depressão, mas entendendo de onde vem essa tristeza, esse sintoma, a gente muitas vezes identifica como a síndrome do ninho vazio”, explica.

A profissional revela que a dor sofrida pelas mães pode ser extremamente forte, mas que há caminhos para amenizá-la. “A gente sempre indica para que elas busquem ocupações, pois geralmente são donas de casa, aposentadas. Então, a ideia é que procurem uma distração para não ficar pensando só nisso e sofrendo”, orienta.

Entre as indicações, estão clube de mães, atividades físicas, busca por um hobby e a até própria terapia.

Lado B

A psicóloga conta ainda que durante as sessões de terapia tenta destacar o lado dos filhos na história. “É bom mostrar a importância da independência do filho. Saber que as mães estão em sofrimento também causa dor neles”.

Além disso, Ana Cláudia comenta que, em muitos casos, é preciso desenvolver um sentimento de confianças nas mães. “Tentamos mostrar que ela fez tudo o que podia enquanto mãe na infância e adolescência do filho, tanto em relação à questão financeira, carinho e formação de caráter. Queremos que as mães pensem: ‘Poxa, eu ensinei muita coisa para ele, agora tenho que confiar que vai colocar em prática’”.

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