Através do humor, mulheres expressam práticas sexuais que ‘não toleram’ mais

Nas últimas semanas, viralizou nas redes sociais alguns vídeos postados por mulheres sobre formas de práticas sexuais que elas não têm tolerado mais. O contexto virtual tem criado oportunidades de posicionamento importantes e o humor tem sido uma forma de tornar as discussões mais agradáveis ou até mesmo possíveis.

No entanto, é importante fazer uma ressalva: cuidado! O humor pode manter relações de desigualdades quando reforça estereótipos e promove sentimentos de inadequação nas mulheres. A piada pode se tornar um desserviço à vida sexual.

Sexo é uma troca. Nem todo mundo vai aproveitar da mesma forma e nem ter prazer do mesmo jeito e no mesmo momento – Foto: Pexels/Divulgação/ND

Repare que eu disse “formas de práticas sexuais”. O que quero dizer com isso? Sexo vaginal, sexo anal, sexo oral, masturbação, dentre outras, são práticas sexuais. Ou seja, por definição, a prática sexual é qualquer atividade de cunho sexual que visa o prazer, a comunicação e/ou a reprodução. As reflexões trazidas pelas mulheres estão sendo sobre as formas como as posições e práticas sexuais são solicitadas e mensuradas.

Acredito que mais do que satirizar as situações sexuais, as mulheres estão trazendo à tona uma realidade (ou seria insatisfação?) sexual, fruto de autoconhecimento, autopermissão e até mesmo autonomia. Elas têm que dar conta fisicamente para ficar bom para eles?

Não deve ser algo que ninguém dê conta

Sexo é, sim, uma atividade física. Há um desgaste físico recompensado pelo prazer e relaxamento que vem em seguida. Mas não deve ser algo que ninguém não dê conta. É importante ter condicionamento físico, saúde física, mental e sexual para qualquer atividade física no dia a dia, e com o sexo não seria diferente. Mas precisa ser performático? Estamos medindo desempenho? Onde entra o pornográfico?

Não podemos negar o papel da pornografia no comportamento sexual, que aparece aqui como exigência de desempenho e performance, sem falar nas questões de gênero implicadas. Homem é mais forte fisicamente? Homem se empenha mais? A mulher “não dá conta”? Homens se cansam mais durante o sexo? O papel da mulher no sexo é moleza? Tem que enfiar tudo de uma vez?

Porém, não crucificarei a pornografia, já que, da mesma forma que o excesso de consumo de conteúdos pornográficos pode comprometer as vivências da sexualidade por influenciar negativamente na construção da compreensão do que é sexo, prazer e consentimento, pode também ser usada como estímulo e fantasia sexual. Há vantagens e desvantagens no uso da pornografia, mas essa reflexão fica para outro momento.

Os dois precisam de prazer

Sexo é uma troca. Nem todo mundo vai aproveitá-lo da mesma forma, nem ter prazer da mesma maneira ou, ao mesmo tempo. Se a maior preocupação é quantas vezes se está indo fundo ou quão rápido se está quicando, isso é sobre o espetáculo e não sobre o prazer. Além disso, o corpo da mulher não pode ser compreendido como um mero objeto de prazer sem limites físicos. Isso pode levar a um distanciamento da pessoa com a qual se está tendo uma relação sexual.

Se a maior preocupação é quantas vezes se está indo fundo ou quão rápido se está quicando, isso é sobre o espetáculo e não sobre o prazer – Foto: Reprodução/Pixabay/ND

É sabido que, de maneira geral, os homens consomem pornografia e esperam que as mulheres executem as fantasias deles. Existe uma idealização de uma performance espetacular, na qual a mulher deve ter gemidos e orgasmos exagerados, “esguichar” grandes quantidades de líquido, ter corpos simetricamente perfeitos e sem pelos, e conseguir quicar por horas e enfiar profundamente com o mínimo de estimulação.

Com isso, onde ficam a comunicação, as emoções e afetos, os desejos e fantasias, o envolvimento e o prazer?

É muito importante dar visibilidade à sexualidade feminina e às suas insatisfações, como as trazidas por mulheres nas redes sociais. O corpo da mulher e a sua sexualidade não são apenas sobre onde se localiza o clitóris. É sobre conexão, troca, prazer, cumplicidade e consentimento.

Então, com esta reflexão te pergunto: elas têm que dar conta fisicamente para ficar bom para eles? É preciso repensar a educação para a sexualidade, pois as mulheres já não estão topando (ainda bem) a continuarem a dar prazer a um homem sem importar se a prática sexual é prazerosa para ela. Se a machuca, a incomoda ou causa constrangimento, não é legal. O óbvio? Sim, mulheres têm vontade, desejos e interesses próprios e estão começando a falar sobre isso.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.