Ceisa Center: um ícone da arquitetura de Florianópolis vai ser revitalizado

Um dos prédios mais icônicos de Florianópolis, o Ceisa Center vai passar por uma revitalização que pretende humanizar sua relação com os usuários e tornar mais permanente e duradouro o contato dos transeuntes com o centro comercial. Um projeto feito pelos arquitetos Rudivan Cattani e Leonardo Bertoldi Borges foi apresentado esta semana ao público na galeria do prédio, em forma de exposição, mostrando a história do edifício, na entrada da avenida Osmar Cunha, e detalhes das intervenções planejadas, no acesso pela rua Vidal Ramos. Aprovado por uma comissão de condôminos, o síndico atual e os arquitetos, o projeto será executado em etapas e deve se estender pelos próximos dois anos.

Quando foi inaugurado, em 1978, o Ceisa Center chacoalhou a cidade. Pessoas vinham de outros lugares para conhecer aquele edifício que lembrava o famoso Copan, projetado por Oscar Niemeyer em São Paulo, e caminhar pelo amplo corredor central, mais largo que muitas ruas de Florianópolis. Profissionais liberais se apressaram em adquirir salas e se instalar ali – era uma questão de status e de se colocar ao lado da modernidade. E os moradores logo adotaram o hábito de circular na galeria, desfrutar das lojas, cafés e serviços oferecidos. Foi uma verdadeira revolução que mudou o eixo comercial da Capital do Estado.

Esculturas de Elke Hering Bell (um torso e a obra “Fruto Partido”) poderão ser melhor apreciadas – Foto: Leo Munhoz/ND

Quatro décadas e meia depois de entregue, o Ceisa perdeu algumas marcas originais e entrou no rol dos edifícios modernos que reclamam uma requalificação para se manterem atraentes do ponto de vista comercial. “Muitos aspectos projetados na década de 1970 estão hoje ocultos ou encobertos”, diz o arquiteto Rudivan Cattani. Ter parado no tempo, em termos de atenção às novas demandas, fez com que muitos médicos e advogados, por exemplo, se mudassem para outros prédios mais modernos e seguros na cidade.

O projeto em curso – já houve pequenas intervenções na pintura da galeria – quer eliminar a poluição visual e padronizar as fachadas e o layout das lojas. A atualização dos lobbies dos três blocos, com novos revestimentos nas paredes e novas esquadrias, também está prevista. A revitalização vai se concentrar, no primeiro momento, na galeria térrea e nos três acessos, interferindo ainda nos canteiros externos, na vegetação, na posição das obras de arte, na melhoria do piso e na valorização da escada que leva à garagem.

As mudanças foram planejadas levando em contra os resultados de uma pesquisa acadêmica e entrevistas feitas por Leonardo Bertoldi Borges, que é mestrando em arquitetura, e também imagens da construtora que ergueu o prédio e plantas originais. Valorizar o patrimônio e dar nova vida ao Ceisa, a partir de uma grande intervenção visual, é o que move os mentores e executores do projeto.

Haverá uma reformulação de todas as fachadas – Foto: Leo Munhoz/ND

A volta aos padrões da construção original

Quando o projeto estiver a pleno vapor, os usuários vão ser contemplados com um café no corredor que ampliará o espaço de convivência e com quiosques colocados próximo à escada que ocuparão o lado oposto, não mais o meio da galeria. As esculturas de Elke Hering Bell (um torso e a obra “Fruto Partido”, na entrada pela avenida Osmar Cunha) poderão ser melhor apreciadas, graças a um canteiro elevado que destacará suas presenças no cenário. Já a cascata de água no acesso pela rua Vidal Ramos, obra do artista Miguel Vinhas, voltará ao formato original, com um remanso na parte inferior e sem a interferência de elementos visuais que desviavam a atenção dos passantes.

A lista de melhorias inclui ainda a colocação de bancos na galeria – uma carência que hoje expulsa os transeuntes – e a recuperação do piso, que voltará a ter o aspecto original graças a um processo de lixamento químico. Haverá uma reformulação de todas as fachadas das lojas e o foro da galeria ganhará mais iluminação e homogeneidade. Também será feita uma padronização externa, recuperando a antiga aparência de equilíbrio e unidade. A entrada pela rua Leoberto Leal, a menos movimentada de todas, será igualmente mudada, sem prejuízo do ponto de táxi que atende a demanda naquela região da cidade.

A lista de melhorias é grande, mas tudo conflui para a valorização do patrimônio que é o Ceisa. Até o final da década de 1970, quando as principais atividades comerciais e de serviços se concentravam nas ruas Felipe Schmidt e Conselheiro Mafra, a região da atual avenida Osmar Cunha era essencialmente residencial. A cidade cresceu naquela direção, e dali se expandiu para a área de chácaras da antiga Praia de Fora, muito em função do empreendimento.

Inovações que chegaram para ficar

Com 30 mil metros de área construída, o Ceisa tem 330 salas comerciais, 33 lojas e 180 vagas de estacionamento. No dia da inauguração, em 27 de junho de 1978, um comercial de página inteira no jornal “O Estado” anunciava o edifício como “a mais nova sensação da cidade”. A agência A. S. Propague, responsável pela campanha, também fez jingles para rádio e televisão que hoje surpreendem pela simplicidade. O empreendimento veio concorrer com o primeiro centro comercial da cidade, o ARS (Centro Comercial Aderbal Ramos da Silva), estrategicamente situado no coração do varejo na Capital.

Se o empreendimento pioneiro tinha acesso pelas vias mais movimentadas da cidade (as ruas Felipe Schmidt e Conselheiro Mafra), o Ceisa contava com três entradas e exibia o diferencial de ostentar uma ampla galeria semipública, de passagem da avenida Osmar Cunha e rua Leoberto Leal para a rua Vidal Ramos, e vice-versa.

O ARS tinha escada rolante, então uma novidade que também mexeu com a cidade, e os planejadores do Ceisa resolveram não ir pelo mesmo caminho. Adroaldo Pereira, 90 anos, então um dos sócios da empresa Ceisa (Construções e Empreendimentos Imobiliários S. A.), esteve no lançamento do projeto de revitalização e deu a entender que os administradores do ARS “tentaram combater” o novo projeto. Houve mudanças no planejamento e criou-se no Ceisa o sistema de lojas com sobrelojas, que Pereira qualificou como uma “dinâmica maravilhosa”.

Ceisa Center tem um espaço generoso de circulação – Foto: Leo Munhoz/ND

Outro diferencial foi o uso pioneiro do concreto protendido em uma obra desse porte em Florianópolis – uma decisão que surgiu depois que a maquete já estava pronta. O sistema oferece maior resistência e dá a possibilidade de fazer vãos maiores e utilizar pilares e vigas mais finas nas construções, resultando em demanda de menos concreto e, consequentemente, em maior economia. Quem trouxe a novidade foi o engenheiro paranaense Manfred Schmidt, que propôs uma mudança no projeto e acompanhou a sua execução até o fim. No Brasil, um exemplo clássico do uso dessa tecnologia é o Masp (Museu de Arte de são Paulo), que tem um vão livre de 74 metros.

O arquiteto Moysés Liz, sócio da empresa Liz Cassol Monteiro (Moysés Liz, Ademar Cassol e Odilon Monteiro), que projetou o Ceisa Center, reforça que a obra arquitetônica foi uma revolução porque, além do grande porte, “criou um espaço generoso de circulação” em seu miolo. Aos 88 anos, ele lembra de “ter trabalhado com os melhores arquitetos da cidade”, com os quais projetou obras importantes como a Biblioteca Pública do Estado, o Tribunal de Contas e a nova sede do CRM/SC (Conselho Regional de Medicina de Santa Catarina). Nos anos 1970, recorda, Florianópolis “era uma cidade pacata, mas pitoresca e agradável”.

A importância de preservar a arquitetura moderna

A preocupação dos arquitetos Leonardo Bertoldi Borges e Rudivan Cattani é com a falta de valorização da arquitetura modernista em Florianópolis – mas não só aqui. “Os prédios modernos também têm história”, afirma Leonardo. Muitas edificações das décadas de 1960 e 1970 já foram demolidas sem deixar registros significativos, porque os filhos dos proprietários venderam os imóveis e não pensaram em guardar fotos e plantas de casas e edifícios.

Neste sentido, o Ceisa Center pode ser um importante laboratório. Em primeiro lugar, porque é um prédio de excelência, até hoje citado como um ícone da cidade. Além disso, há algumas similaridades construtivas com outras edificações, entre elas o prédio da Secretaria de Estado da Educação, mais ou menos da mesma época.

Construída sobre um terreno onde funcionava o Departamento de Obras Públicas do Estado, o Ceisa tem um desenho sinuoso porque, na época da construção, os empreendedores não conseguiram adquirir um terreno que ficava de frente para a rua Vidal Ramos e tiveram que adaptar o projeto ao espaço existente. Há quem considere essa versão uma lenda, mas o fato é que, com ou sem o folclore que se criou em torno dele, o prédio ainda é um dos mais atraentes de Florianópolis, cujas peculiaridades são testemunhadas pelas mais de 10 mil pessoas que passam por ali todos os dias.

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