Ossadas de mais de 150 pessoas são encontradas embaixo de campo de futebol

O volume e a disposição das ossadas sugerem um cenário de batalha intensa e morte em massa – Foto: Reiner Riedler/Museu de Viena

Ossadas de mais de 150 pessoas, em uma vala comum romana, foram encontradas embaixo de um campo de futebol no distrito de Simmering, em Viena, na Áustria. A descoberta veio à tona durante a reforma do campo, informou o Museu de Viena na última quarta-feira (2).

Segundo o museu, as ossadas pertencem, em sua maioria, a homens jovens, mortos violentamente, e datam de um período da presença romana na região, entre o final do século I e o início do século II d.C.

Os arqueologistas já consideram o achado “um incrível tesouro de informações”, pois ele traz mais dados sobre os conflitos militares da época romana e pode ajudar a compreender melhor a expansão da antiga Vindobona, precursora da Viena moderna, segundo os especialistas.

A localização das ossadas, sob um campo de futebol, surpreendeu até os arqueólogos mais experientes – Foto: A. Slonek, Novetus/Museu de Viena

“Tenho pesquisado sobre a Viena romana há 25 anos e pensei que nada mais poderia me surpreender — e então essa descoberta aconteceu”, diz Michaela Kronberger, chefe das coleções do Museu de Viena.

Descoberta inesperada em Simmering

Durante o processo de revitalização do complexo esportivo Ostbahn XI, no distrito de Simmering, as escavadeiras contratadas pela prefeitura encontraram um grande acúmulo de ossadas humanas.

Após serem informados, o Departamento de Arqueologia da Cidade de Viena iniciou imediatamente as escavações, com o apoio de outros especialistas. “Neste local distante […] alguém inicialmente suspeitaria de um poço de peste ou de uma conexão com o Segundo Cerco Otomano”, comentou Kristina Adler-Wölfl, chefe do departamento.

Entre as ossadas, foram encontrados indícios claros de violência, como cortes e fraturas – Foto: Reiner Riedler/Museu de Viena

Em uma área de apenas cinco por quatro metros e meio, foram documentados pelo menos 129 esqueletos intactos. Porém, a presença de muitos ossos espalhados — provavelmente causada pelas reformas no local antes da sua interrupção — impede a confirmação do número exato.

Ainda assim, os especialistas sugerem um número superior a 150 indivíduos. A forma como as ossadas foram encontradas sugere que não houve um enterro formal para esses homens, pois estavam dispostas de maneira desordenada e em posições variadas, como de bruços ou de lado.

Muitos também estavam empilhados ou espalhados. Os arqueólogos acreditam que os homens mortos foram simplesmente abandonados, o que indicaria um descarte apressado, sem qualquer tipo de ritual funerário.

Confira o que foi encontrado no local:

As ossadas estavam espalhadas de forma desordenada, sem sinais de sepultamento cerimonial - Reiner Riedler/Museu de Viena

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As ossadas estavam espalhadas de forma desordenada, sem sinais de sepultamento cerimonial – Reiner Riedler/Museu de Viena

Adaga militar romana  - L.Hilzensauer/Museu de Viena

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Adaga militar romana – L.Hilzensauer/Museu de Viena

Bainha de adaga no Raio-X - Tim Tom/Museu de Viena

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Bainha de adaga no Raio-X – Tim Tom/Museu de Viena

Osso pélvico com trauma de ponta de lança - S. Strang, Novetus/Museu de Viena

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Osso pélvico com trauma de ponta de lança – S. Strang, Novetus/Museu de Viena

Vértebras lombares com trauma de parafuso de ferro - S. Strang, Novetus/Museu de Viena

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Vértebras lombares com trauma de parafuso de ferro – S. Strang, Novetus/Museu de Viena

Entre as ossadas, foram encontrados indícios claros de violência, como cortes e fraturas - Reiner Riedler/Museu de Viena

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Entre as ossadas, foram encontrados indícios claros de violência, como cortes e fraturas – Reiner Riedler/Museu de Viena

Escavação em Hasenleitengasse - Reiner Riedler/Museu de Viena

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Escavação em Hasenleitengasse – Reiner Riedler/Museu de Viena

Escavação em Hasenleitengasse - A. Slonek, Novetus/Museu de Viena

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Escavação em Hasenleitengasse – A. Slonek, Novetus/Museu de Viena

Imagem dos trabalhos de escavação - Ossadas encontradas em campo de futebol (5)

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Imagem dos trabalhos de escavação – Ossadas encontradas em campo de futebol (5)

A quem pertenciam as ossadas?

Segundo resultados preliminares da análise antropológica, baseados em mais de um terço dos esqueletos, a maioria era composta por homens com mais de 1,70 metro de altura, entre 20 e 30 anos, e em boa condição física antes da morte.

A causa da morte foi confirmada como trauma por força contundente e por armas afiadas, como lanças, punhais, espadas e até dardos de ferro disparados à distância.

“Cada um dos esqueletos examinados até agora tem pelo menos um ferimento que foi infligido no momento da morte”, afirma Michaela Binder, da empresa Novetus, responsável pelas análises.

A presença de muitas armas descarta a hipótese de uma execução em massa e, como não havia mulheres e muito menos crianças, também não se trata de uma epidemia ou de um hospital. Os especialistas apontam para um cenário de batalha violenta.

A datação por Carbono-14, técnica usada para determinar a idade de materiais orgânicos, indicou que o evento ocorreu entre os anos 80 e 230 d.C., durante o período da presença romana na região.

Porém, objetos encontrados junto às ossadas ajudaram a especificar essa estimativa para meados do século I até o início do século II d.C. Um dos achados mais importantes, segundo os especialistas, foi o fragmento de uma adaga de ferro com sua bainha.

Exames de raio-X revelaram que a peça tinha detalhes típicos do estilo romano, como fios de prata incrustados na lâmina, um tipo de decoração comum naquele período.

Bainha de adaga, encontrada em meio as ossadas, no Raio-X – Foto: Tim Tom/Museu de Viena

“A arqueologia é sempre sobre forma, material e decoração”, explica o arqueólogo urbano Christoph Öllerer.

Também foram encontrados pregos das sandálias usadas por soldados romanos e uma parte de capacete próxima a alguns esqueletos. Esses itens confirmam que se trata de uma vala comum de soldados romanos.

Contexto histórico

A descoberta aconteceu em uma época que, até então, era vista como tranquila na região de Viena. Porém, alguns registros antigos falam sobre ataques de tribos germânicas contra o Império Romano por volta do ano 92 d.C., incluindo a destruição de uma legião inteira.

Os especialistas acreditam que as ossadas podem ser a primeira prova física desses conflitos. Isso pode ajudar a explicar por que os romanos decidiram reforçar a presença militar na área, transformando a pequena base chamada Vindobona no que mais tarde se tornaria a cidade de Viena.

“Não podemos esquecer que estes são os restos mortais de 150 jovens que foram massacrados da forma mais horrível. Devemos, portanto, lidar com essa descoberta com a máxima sensibilidade. Ao mesmo tempo, ela representa um incrível tesouro de informações”, finaliza Michaela Kronberger

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