Conheça Carl Hoepcke, o estruturador da economia de SC

Figura crucial no processo de desenvolvimento de Santa Catarina, o empresário Carl Hoepcke morreu há quase um século, em janeiro de 1924, deixando um legado cuja relevância pode ser constatada até hoje em Florianópolis e no Estado. O império que ele construiu foi diluído com o tempo e com a diversificação das atividades abraçadas pelos descendentes, mas as pegadas do pioneiro, nascido na Alemanha em 1844 e brasileiro por adoção a partir de 1863, estão em diferentes endereços da Capital catarinense.

O imigrante alemão Carl Hoepcke – Foto: Divulgação Instituto Carl Hoepcke

Quem visita o Armazém Rita Maria, um complexo de gastronomia e lazer próximo ao que era o antigo porto da cidade, por exemplo, encontra o leme de quase duas toneladas que foi de um navio da Cia. Hoepcke que singrou os mares brasileiros durante várias décadas. Da mesma forma, quem frequenta o Top Market Floripa, outro espaço de restaurantes e eventos inaugurado recentemente, se depara com equipamentos da antiga Fábrica de Rendas e Bordados Hoepcke preservados em meio a um conjunto de cafés e bares sempre repletos de frequentadores.

A visão e a capacidade de empreender do imigrante germânico fez com que se dissesse, com muita propriedade, que ele foi o “homem mais moderno” que Santa Catarina já teve, ainda que o complexo de indústrias, a empresa de navegação que levou o seu nome e a rede comercial que abrangeu as principais regiões do Estado tenham sido criados a partir da segunda metade do século 19.

O número de empresas e a diversidade de áreas alcançadas fizeram da Cia. Hoepcke um dos maiores conglomerados da Sul do Brasil, numa época em que não existia aviação e as estradas trafegáveis eram muito raras. Daí a importância da Empresa Nacional de Navegação Hoepcke, que conectava a cidade do Desterro, antigo nome de Florianópolis, aos portos de Laguna, Itajaí, São Francisco do Sul, Paranaguá, Santos, Rio de Janeiro e Recife. Dessas cidades portuárias, os produtos transportados ganhavam o continente, o interior do país.

Em Florianópolis, já no século 20, a chegada das embarcações da Cia. Hoepcke eram acontecimentos de grande repercussão, especialmente quando atracava no porto o navio de passageiros. O navio Hoepcke levava e trazia pessoas para Santos e Rio de Janeiro, provocando grandes concentrações no cais, nas despedidas e reencontros. Era por meio do transporte marítimo, também, que a cidade recebia produtos de vestuário, livros e as novidades da moda que o Rio, capital da República, espalhava pelo país. Além do Hoepcke, a companhia tinha os navios Anna e Max, para o transporte de cargas.

Em Desterro/Florianópolis, o complexo criado por Carl Hoepcke incluía a fábrica de rendas e bordados (que ainda mantém uma unidade do bairro Roçado, em São José), uma fábrica de pregos, uma fábrica de gelo, a empresa de navegação e a casa Hoepcke, empresa comercial com filiais em todo o Estado.

Instituto preserva a memória do pioneiro

Carl Franz Albert Hoepcke nasceu em Striesa, estado de Bandemburgo, na Alemanha, em 25 de junho de 1844. Veio para o Brasil aos 19 anos, com a mãe (o pai morreu cedo, aos 43 anos), um irmão e uma irmã, incentivados por um tio, Ferdinand Hackradt, proprietário de um estabelecimento comercial na cidade do Desterro. A família morou três anos em Blumenau, e já na Capital, a partir de 1866, Carl empregou-se na firma do tio como contador e poucos anos depois substituiu Hackradt no cargo de cônsul alemão na Ilha de Santa Catarina. Assumiu definitivamente o consulado em 1885 e tornou-se cônsul honorário da Alemanha em 1904.

O empresário casou com Bertha Pirath, nascida na Alemanha, com quem teve cinco filhos, e em segundas núpcias com Anna Haendchen, que lhe deu dois filhos. Ele morreu em 8 de janeiro de 1924 e está enterrado no cemitério São Francisco de Assis, no bairro Itacorubi, na parte conhecida como Cemitério Alemão.

Uma das heranças da família em Florianópolis é o Instituto Carl Hoepcke, fundado em junho de 2004 com o objetivo de preservar a memória de seu patrono. Foi dirigido pelas bisnetas Annita Hoepcke da Silva (falecida em março de 2021) e Silvia Hoepcke da Silva, filhas do ex-governador Aderbal Ramos da Silva e de Ruth Hoepcke da Silva.

O centro cultural mantido na sede do instituto guarda documentos, fotografias, mapas, livros e objetos que têm relação com a história da família, da empresa e de cidades de colonização alemã em Santa Catarina. “Com meu bisavô, teve início a industrialização de Santa Catarina”, disse então a bisneta Annita, falando da herança deixada por Carl Hoepcke para Florianópolis e o Estado.

Na Alemanha, em busca das raízes da família

Na década passada, Annita Hoepcke da Silva visitou a região de Striesa (hoje uma vila com pouco mais de 40 moradores) atrás de informações sobre o bisavô. Era uma tentativa de buscar as origens do arrojado empreendedor que criou o maior império industrial do Estado e foi chamado de “estruturador da economia catarinense”.

Ela conheceu a família que mora na mesma propriedade dos antepassados, entrou na igreja frequentada no século 19 pela família do bisavô, em Lebusa, viu construções remanescentes da mesma época, foi até a casa do administrador da propriedade onde Ludwig Hoepcke (pai de Carl) trabalhou, na região de Priegnitz, e circulou pelo bairro de Moabit, em Berlim, de onde a bisavó Henriette e os filhos embarcaram num trem rumo a Hamburgo, em cujo porto tomaram um navio para o Brasil, em 1863.

Rompeu-se, assim, um isolamento bilateral de um século e meio, porque nenhum descendente de Carl Hoepcke havia visitado a região de origem do futuro empresário que saiu da Alemanha com 18 anos – ele fez o 19º aniversário no navio. “Em todos os lugares, fomos recebidos com fidalguia”, disse Annita, à época, após o retorno da Alemanha.

As lojas de comércio, as fábricas e todas as unidades do conglomerado empresarial, que também incluía operações de importação de máquinas para o nascente parque fabril estadual, se mantiveram ativas mesmo após a morte da Carl Hoepcke, em 1924. Mais tarde, as gerações seguintes da família diversificaram os negócios, apostando em segmentos como a revenda de carros e a construção civil.

Muitos prédios ainda são erguidos em terrenos que foram administrados pelo pioneiro em Florianópolis. É o caso dos complexos empresariais Top Market Floripa e Armazém Rita Maria, instalados numa antiga unidade de produção de rendas e bordados e nos velhos galpões do porto, respectivamente. Uma fábrica de rendas gerenciada pela bisneta Sílvia Hoepcke da Silva em São José é a única remanescente da fase áurea dos negócios do grupo.

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